Como é que se começa um release? Com
o título, claro. Mas e depois? Talvez seja bom falar de algum prêmio que o
espetáculo ganhou. Mas e depois? Como fazer um release tradicional de uma peça
tão pouco tradicional? Como fazer um release quando você não estudou jornalismo
e é só um ator que está fazendo um monólogo e não confia em ninguém pra
escrever o release?
Aqui quem voz escreve é o Gregório. E
eu não sei como se escreve um release. Certamente não é dessa maneira que eu
estou escrevendo. Então espero que não estranhem. Vou falar um pouco sobre a
peça. Ou melhor: sobre o que eu acho da peça.
O gênero do espetáculo é híbrido. Não
se sabe ao certo se é uma comédia com momentos tristes ou um drama cheio de
humor. Talvez o termo correto seja "epopéia lírica-sentimental". Mas
é um termo pomposo demais. Talvez seja melhor dizer: é como aquelas músicas
sobre dor-de-corno. Mas aí é pomposo de menos. É mais fácil falar sobre o que
fala a peça. Fala de um homem, em cima de um palco, pensando. Tudo o que ele
pensa, ele fala. E a peça é o pensamento dele.
Sobre o João Falcão: nunca vi um
artista tão infalível. Suas peças são dramaturgicamente perfeitas. Tanto é que
ele já ganhou toda sorte de prêmios como autor: Shell, Sharp, Mambembe, Qualidade
Brasil. E as peças dele costumam ficar anos em cartaz, arrebatando público e
crítica. Uma Noite na Lua levou o prêmio Sharp de Melhor Texto e o APCA de
Melhor Ator para o Nanini, para quem a peça foi escrita, e com quem ela ficou
três anos em cartaz. Sobre a peça, João diz: "É o texto mais auto
biográfico que já escrevi. Não em relação à história, mas aos sentimentos.
Todos os sentimentos que estão ali eu já senti." A peça fala sobre um
autor, sobre criatividade, mas também sobre amor, e sobre solidão. Mesmo quem
não escreve se identifica porque ama, ou já amou. E quem não escreve e nem
nunca amou ninguém? Aí não se identifica. Mas aí também é um tipo de gente que
não nos interessa.
Pessoalmente, vos garanto: é o texto
mais perfeito que eu ja li. Não trocaria uma palavra, uma vírgula, um ponto. A
peça fala da solidão de um autor obsessivo. Abandonado pela mulher amada, ele
tem que escrever uma peça que faça ela voltar. Mas a obsessão pela mulher o
impede de pensar na peça. Aos poucos vamos vendo que a peça que estamos
assistindo é a peça que ele está escrevendo, num jogo infinito de espelhos.
Voltando às palavras de João: "A peça fala sobre uma coisa que todo mundo
sente. Desejo de ser amado. E até onde isso pode levar."
Para essa montagem, João optou por
uma encenação nua, crua e espartana. Não há nada sobre o palco. Nada além do
ator. É uma caixa preta. Essa caixa se revela ora casa do ator ora a cabeça do
ator ora a lua, onde o autor passa as noites. "Queria uma encenação
econômica, diz João, o ator desapoiado de cenarios, cadeiras ou praticáveis,
sem caminhadas, nada." Durante toda a peça, o ator quase não sai do metro
quadrado central. E dentro dele, tudo acontece. Maximizam-se as possibilidades
cênicas de um espaço restrito, localizando o ator dentro desse não-lugar que é
o lugar do pensamento.
Para contracenar com o ator (ou sobre
mim - ainda não decidi que pronome usar), foi desenhado um jogo de luz
impressionante, criado pelo próprio João: toda a iluminação da peça é feita por
moving lights, que, como o nome
indica, são luzes móveis, que não param quietas. Muito comuns em shows de
música, o uso no teatro ainda é raro. A mobilidade constante da luz faz com que
ela se torne, nessa peça, muito mais que luz. Ela é cenário, trilha sonora e mil
personagens. Ela esvazia o palco quando é preciso e o povoa em uma fração de
segundo quando é preciso. Merecia um prêmio de melhor atriz coadjuvante, no
mínimo.
A trilha, também composta pelo
próprio João, foi gravada e arranjada pelos músicos Dani Black e Maycon
Ananias. Ambos são oriundos da talentosíssima nova safra de compositores
paulistanos. Dani pertencia ao grupo 5 a seco e agora brilha em carreira solo.
Maycon é pianista clássico e produtor musical da cantora Maria Gadu. A trilha
de Uma Noite na Lua foi gravada em Buenos Aires, quase integralmente gravada
com cordas de todos os tipos: violão, violoncelo, violino e contrabaixo.
O processo de ensaios foi muito
prazeroso. Alugamos uma casa e nos trancamos por um tempo. Éramos poucos a
ensaiar: João, seu assistente João Vancini, eu e os músicos (toda a trilha foi
composta para que coubesse no tempo exato das falas, e não o contrário). Mas também
foi infinitamente árduo. Durante os meses que antecederam o espetáculo, fiz, a
pedido do João, uma intensa preparação corporal com o acrobata e palhaço Gilvan
Gomes, do AfroCirco. Foram meses de acrocacia solo, aérea e malabares. Embora a
peça não lance mão, diretamente, de nenhum desses recursos circenses, foi
fundamental para buscar a disponibilidade, flexibilidade e o equilíbrio
necessários. E, a parte mais difícil, para mim, não foram os malabares, nem o
monociclo (sim, eu aprendi a andar de monociclo), mas o próprio texto. O texto
do João é cíclico e labiríntico, é muito fácil de se perder. Nunca lidei com um
texto tão difícil de decorar. Para mim é especialmente difícil, porque a minha
formação como ator é o improviso. Não costumo decorar os textos. Em geral
decoro aproximadamente e falo o texto da maneira que ele surge na hora. Mas não
dá pra enganar o João falando um texto aproximado: ele sabe de cor, muito melhor
que eu (e nem seria uma boa idéia mudar um texto tão impecável). São 34
páginas, que resultam em 60 minutos de texto ininterrupto. Sim, a peça tem uma
hora cravada. Nem um minuto a mais, nem um minuto a menos. Sobre o ator que faz
a peça, João falou: "Gregório é o ator que todo diretor pediria a Deus se
todo diretor fosse feito eu." Mas acho que só disse isso porque eu estava
apontando um revólver para a sua cabeça.
No momento em que eu escrevo esse
"release", faz um ano que a peça estreou. De lá pra cá, tudo mudou. A
peça tem feito uma turnê linda pelo Brasil e arrancado elogios e críticas
maravilhosas Em Agosto de 2012, fundamos a Porta dos Fundos, que hoje é o maior
canal de humor do Brasil e um dos maiores do mundo. Ganhamos o APCA de melhor
programa de humor da televisão, mesmo nunca tendo passado na televisão. O filme
Vai que Dá Certo foi um sucesso tremendo de bilheteria. Parece que tudo está
dando certo. E tenho certeza de que a peça tem a ver com isso.
A verdade é essa: nunca fui tão feliz
fazendo uma peça. Amo fazer peças com grandes elencos. O Tablado, escola de
teatro que eu frequentei por 10 anos, é famoso por fazer peças com elencos
gigantescos. E lá também eu fui muito feliz. No entanto, nada se iguala à
alegria de subir no palco sozinho, contar uma história desprovida de
pirotecnias e ainda assim fazer rir e emocionar. Isso é um ponto importante
para mim: nunca antes tinha feito chorar (ao menos não propositalmente). E
fazer chorar é tão lindo quanto fazer rir. Os dois juntos, então, é o que mais
me faz rir. E chorar. Toda noite que eu passo na lua eu choro de felicidade e
paixão pelo teatro. Obrigado, João!
Sobre João Falcão
Depois de iniciar a carreira no
Recife no início dos anos 80, o diretor e autor teatral João Falcão fez do Rio
de Janeiro sua casa: na cidade, na década de 90, estreou o
musical infantil ‘A Ver Estrelas’. A partir dele, enfileirou um número
considerável de peças de sucesso, entre adaptações, textos de sua autoria e
direções, entre eles ‘O Burguês Ridículo’, ‘A Dona da História’;
‘Uma Noite na Lua’; ‘A Máquina’; ‘Mamãe Não Pode Saber’;
‘Ensina-me a Viver’ e, mais recentemente, ‘Clandestinos’. Sua incursão como
diretor no cinema rendeu dois longas-metragens: adaptação para a peça ‘A Máquina’
e ‘Fica Comigo Esta Noite’. Na TV, firmou parcerias com o
diretor Guel Arraes, caso de ‘O Auto da Compadecida’, além de trabalhos como
‘Clandestinos – O Sonho Começou’ e ‘Louco por Elas’.
Sobre
Gregorio Duvivier
Gregorio Duvivier nasceu no Rio de
Janeiro, no dia 11 de abril de 1986. Começou a fazer teatro no Tablado, onde
fez aulas por 10 anos. Aos 17, estreou a peça Z.É. - Zenas Emprovisadas, ao
lado de Fernando Caruso, Marcelo Adnet e Rafael Queiroga. A peça, uma maratona
de improvisação, levou o prêmio Shell de Teatro e ficou em cartaz por 10 anos.
Durante esse tempo, Gregorio atuou em uma dezena de filmes (PodeCrer, Apenas o
Fim, À Deriva, Vai Que Dá Certo, 5 Vezes Favela) e uma dúzia de peças (o Lobo
da Estepe, Inbox, Como Vencer na Vida Sem Fazer Força). Escreveu em parceria
com Clarice Falcão a peça Inbox, indicada aos prêmios Questão de Crítica e APTR
de Melhor Texto. Também em parceria com ela, escreveu para os seriados Louco
Por Elas, As Cariocas e As Brasileiras, além do seriado O Fantástico Mundo de
Gregorio, para o Multishow. É integrante e co-criador do canal Porta dos
Fundos, APCA de Melhor Programa de Humor de 2012. No mesmo ano, estreou o
monólogo Uma Noite na Lua e ganhou o prêmio APTR de Melhor Ator. Gregorio é
formado em Letras pela PUC-Rio.
“João Falcão torna a sua
“Uma noite na lua” divertida, fascinante, melancólica, um
exemplar excepcional da nova dramaturgia brasileira.”
“Uma noite na lua” tem
agora uma nova montagem de alta
categoria, uma noite de teatro de alta qualidade.”
“Dirigido pelo autor, Gregório
Duvivier foi guiado para ter uma atuação precisa, que consegue
transmitir o caos interno do protagonista sem exageros, buscando a todo momento
a verdade daquela crise...”
Bárbara Heliodora, O
Globo, 7 de junho de
2012
Sinopse de
‘Uma Noite na Lua’:
Escritor sem um único título de sua
autoria luta para enfim terminar uma peça sobre um homem solitário
que processa suas ideias em cima de um palco e vive às turras com a recordação
de Berenice, sua ex-mulher.
Ficha Técnica:
Dramaturgia, canção original,
iluminação e direção geral: João Falcão
Ator: Gregório
Duvivier
Direção
Musical: Dani Black e Maycon Ananias
Direção de
produção: Roberta Brisson
Programação de
Luz: Cesar Ramires
Técnico de
som: Branco Ferreira
Figurino: Hugo
Leão
Consultoria de produção: Jô
Abdu
Ass. de
Imprensa: Smart Mídia Com. - André Gomes
Programador visual
- Júlia Coelho
Preparador corporal
- Gilvan Gomes
Assistente de
direção: João Vancini
Realização: Branco
Produções
THEATRO SÃO PEDRO (Pça. Mal. Deodoro, s/nº)
DIAS 22 E 23 DE AGOSTO – Quinta e Sexta
21 HORAS
INGRESSOS À VENDA NO LOCAL, À PARTIR DO DIA 15 DE JULHO.
Platéias = R$ 80,00
Camarotes Centrais e Foyer= R$ 60,00
Camarotes Laterais = R$ 50,00
Galerias = R$ 30,00